Polícia Civil alerta que o cuidado com o outro, principalmente quando vulnerável, é uma obrigação de todo cidadão.
Por Jô Andrade e Ana Carolina Ferreira, g1 Minas — Belo Horizonte
Após uma jovem, de 22 anos, ser abandonada inconsciente na porta de casa e estuprada na madrugada deste domingo (30), no bairro Santo André, Região Noroeste de Belo Horizonte, a Polícia Civil orienta motoristas de aplicativo de transporte e cidadãos sobre como agir nessas situações.
A vítima esteve em um show do cantor Thiaguinho realizado no sábado (29), no Mineirão, com amigos e colegas de trabalho. Segundo relatos da jovem, ela ingeriu grande quantidade de bebidas alcoólicas e, na hora de ir embora, um amigo chamou um carro de aplicativo e compartilhou o trajeto da viagem com o irmão da mulher, que estava em casa.
Segundo a Polícia Militar, câmeras de segurança registraram o momento em que o carro chegou ao endereço da vítima. Depois de um tempo, o motorista desceu e tocou o interfone, mas ninguém atendeu. Ele ligou no celular do irmão dela e tocou novamente a campainha, sem ter retorno. Depois de um tempo, ele voltou e chamou no prédio, mas ainda não foi atendido.
Por volta das 3h, um homem passou e o motorista pediu ajuda para retirar a jovem do carro. Ela foi colocada sentada na calçada do prédio e o motorista de aplicativo foi embora.
Minutos depois, as câmeras registraram um homem andando pela rua. Ele se aproximou da mulher, a carregou pelas costas e saiu do local levando-a. A vítima foi acordada na manhã do domingo, por socorristas do Seviço de Atendimento Móvel (Samu), que foram chamados por moradores da região.
O que fazer nesses casos
O delegado Saulo de Tarso Castro, da Polícia Civil, explica, de forma geral, que o cuidado com o outro é um dever de todo o cidadão.
“Em casos como este em que o passageiro passa mal, os motoristas, como cidadãos, devem acionar o socorro médico, no caso o Samu ou levar a um pronto-socorro. Neste caso, ele aceitou o transporte da passageira e ela desfaleceu no carro. Ele jamais deveria abandonar a própria sorte, em uma calçada, de madrugada”, explica o delegado.
Ele ainda reforça que o condutor do veículo deve ser responsabilizado, já que a vítima estava sem condições de responder por si, e a família da jovem pode procurar a justiça e mover uma ação cível tanto contra o motorista como também contra a empresa.
“Diante de uma situação de transporte de passageiros, há um compromisso com o passageiro. Do ponto de vista cível, pode ter havido algum tipo de ilícito por parte do motorista”, afirma. “Sob o ponto de vista criminal, o que parece é que há um abandono de incapaz. Um crime previsto no artigo 133, cuja pena de detenção é de seis meses a três anos de prisão. Ela estava desacordada e sem condições de se defender, de ter reação”, diz.
Violência contra a mulher
Para a pesquisadora Lívia de Souza, membro do grupo “Violências, Gênero e Saúde”, da Fiocruz em Minas Gerais, houve uma sucessão de erros graves que terminaram no crime ocorrido no domingo.
“Foram muitas negligências, a começar pelo amigo que não deveria ter deixado a mulher sozinha, seguido pelo motorista de aplicativo, que deveria ter levado ela para uma unidade de saúde ou até mesmo até a Polícia Militar. É inaceitável deixar uma mulher naquele estado no meio da rua”, reforça Lívia.
Segundo a pesquisadora, não basta que o homem não seja violento, é preciso que também exista empatia para que os corpos das mulheres estejam seguros.
No ano de 2021, foram 4.366 casos de estupro contra mulheres em Minas Gerais. Já de janeiro a novembro de 2022, foram 3.642 vítimas desse crime.
“Minha preocupação maior é com a rede de acolhimento a essas mulheres. Que sistema é esse que deixa mulheres violentadas sem nenhuma assistência? Infelizmente, homems não cuidam. Eu acredito que se fosse uma amiga na festa, não teria deixado ela sair de lá sozinha”, afirma Lívia.
Fonte: g1 globo minas gerais