Além da educação básica, pessoas em tratamento contra uso de drogas também participam de cursos profissionalizantes durante a reabilitação.
“Sem a educação, não aprendemos nada. Com a educação, nós somos muito melhores.” É com esse lema, que Jasiel Gabriel Filho dos Santos, de 40 anos, incentiva os colegas a retomarem os estudos. Passados 27 anos na Cracolândia, Jasiel está novamente numa sala de aula — ele deixou de estudar aos 12.
Jasiel é um dos três acolhidos das Casas Terapêuticas que voltaram a estudar com o apoio do Governo de São Paulo, em parceria com a Escola Presbiteriana AEJA Mackenzie. Desde o início de agosto, todos os dias, o grupo que está em tratamento contra uso de drogas se desloca da Vila Mariana, na zona sul da capital, para Santa Cecília, na região central, onde as aulas começam às 18h30.
Jasiel não nega que a rotina é cansativa. Pela manhã e tarde, ele trabalha e faz curso de elétrica pelo Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). Quando retorna para casa, só tem tempo para tomar banho, fazer um lanche e já sai novamente. Apesar de ser corrido, revela que deu o maior passo de sua vida. “Eu falo para eles: se a gente conquistou tudo isso até agora em pouco tempo, estudando podemos ir muito mais longe”
O empenho de Jasiel incentivou Chaddad Alexandre Bento de Oliveira, de 39 anos, a concluir o Ensino Médio. Antes de conhecer as drogas, ele cursava o ensino médio em técnico de enfermagem. Porém, o sonho de trabalhar na área da saúde acabou interrompido. Hoje, Chaddad retomou a antiga meta. “Aqui em São Paulo, eu achei um serviço do Governo do Estado que oferece as oportunidades que eu precisava para recomeçar.”
Além dos estudos, Chaddad participa de um curso de cuidador de idosos que vai permitir que ingresse no mercado de trabalho em breve. E explica que o plano, depois de deixar a Casa Terapêutica, é morar sozinho e retomar sua autonomia.
Já William Castro, de 34 anos, voltou a estudar para não depender de mais ninguém em tarefas do dia a dia. “Era difícil até para preencher uma ficha. Não conseguia fazer. Só conseguia fazer o meu nome e acabou. Tinha muita dificuldade de desenvolver a leitura”, revela.
Ele conta que está sendo muito gratificante voltar para a escola. Há 11 anos, ele é dependente químico e, no começo de 2023, decidiu mudar de vida. E William também se tornou um exemplo para a própria mãe, que é alcóolatra. Desde que o filho começou o tratamento na Casa Terapêutica, ela parou de beber.
Os três acolhidos estão na terceira fase do programa das Casas Terapêuticas, denominada Transformar. Nesta etapa, a pessoa acolhida é inserida no mercado de trabalho e inicia o processo de construção da autonomia. O tempo médio nessa fase é de seis meses.
O que é o programa?
O programa das Casas Terapêuticas no estado de São Paulo foi implementado para inovar o tratamento de dependentes químicos, especialmente os que vivem em situação de rua. No serviço de acolhimento, a pessoa acolhida é atendida por psicólogos, assistentes sociais, pedagogos e terapeutas ocupacionais para o desenvolvimento de habilidades sociais, um novo projeto de vida e o alcance da autonomia de renda e moradia. O período de intervenção pode durar até dois anos, com acompanhamento por mais seis meses para prevenir recaídas.
Gestora da unidade, Shirley Benevides explica que a estratégia na fase Transformar é de reinserir os acolhidos no mercado profissional. “Tudo começa com uma conscientização. A gente disponibiliza cursos de capacitação, oficinas socioeducativas e de preparação para o mundo do trabalho. Então, a gente os prepara até como devem se portar no mercado de trabalho, quais são as exigências e qual a comunicação exigida na sociedade como um todo.”
“A transformação começa desde a primeira fase, mas eu acho que a fase três é a que realmente simboliza a finalização do processo para eles caminharem com as próprias pernas para a moradia e a reinserção à sociedade de forma autônoma”, completa Shirley. Além do Mackenzie, o Estado também conta com parcerias com o Senai, o Senac e o Sebrae.