Por: Priscila Assumpção
A rampa que vinha depois da curva fechada equivalia ao Monte Everest. Quem foi o gênio que pensou em colocar tal desafio na saída de uma simples garagem? Como vencer tal demônio? Era assustadora. Era íngreme ao ponto de exigir habilidade e destreza que eu ainda não possuía. Mas, se não a encarasse agora, não poderia usufruir da carta de motorista recém adquirida. Não poderia dar esse passo decisivo em direção à minha autonomia.
“Vamos lá!” pensei enquanto puxava o ar, como se um pulmão cheio pudesse me dar a coragem necessária. “Pé na embreagem, engata a primeira, vai soltando o pé esquerdo enquanto aperta o pedal direito devagarzinho.” Enquanto a mente repassava os passos para o carro andar, os pés ainda não possuíam a prática necessária para obedecer ao que a mente estava visualizando. O resultado foi um Fusca saltando para a frente rápido demais, o susto de ver a parede chegando, o virar da direção com tudo para a direita e RASP! Raspei o carro na parede direita da rampa. Tentando compensar e sair da parede, virei o volante totalmente para a esquerda enquanto continuava apertando o pedal da gasolina para não voltar para trás. RASP! Raspei a parede da esquerda. E continuei acelerando em direção ao portão no topo da rampa como se minha vida dependesse disso, agora virando mais sutilmente o volante para permanecer no meio da rampa.
No topo da rampa, o garagista responsável por abrir o portão (isso aconteceu muito antes de haver portões elétricos) se jogou para a esquerda do portão quando me viu virar para a direita na rampa e depois para a direita quando me viu ir para a esquerda. Se ele fosse goleiro, não passaria um pênalti por ele, tamanha a destreza em se jogar de um lado para o outro. Para a sorte de todos os envolvidos, ele já havia deixado o portão aberto e eu passei bem no meio a uma velocidade acima da recomendada. Vencida a rampa, parei antes da rua e fiquei sentada, tremendo, esperando a respiração voltar ao normal e meu coração sair da minha boca e voltar ao lugar dele. Fiquei com tamanha vergonha que nem desci do carro para pedir desculpas ao garagista. Ele jamais tocou no assunto, mas nunca mais o vi perto do portão quando eu tinha que subir a rampa.
Colaboradora: Priscila Assumpção, Terapeuta, Mediadora, Especialista em Comunicação.
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