Anuncie aqui

Primeiro Amor

Tinha pra lá de trinta anos que ele não punha o pé naquela cidadezinha. Nunca havia morado lá, mas, na adolescência, teve ali o primeiro amor.
A cidade era praticamente a mesma: a praça, a casa da namorada na esquina, a igreja, as ruas com botecos, o velho cinema fechado desde aquela época, a Caixa Econômica… Quase tudo igual. Exceto as pessoas. Não parecia conhecer mais ninguém.

No banco favorito da praça, um grupo de velhos, de bermuda e chinelo, conversava. No banco onde sonharam com a vida a dois, os filhos que viriam, o consultório, a casa e tudo mais que nunca veio. Tudo parecia tão próximo e real, mas ali se iam mais de trinta anos. Ele tinha dezesseis e ela quinze quando começaram… O cursinho, o vestibular, o começo da faculdade viveram juntos… As viagens, a praia, o primeiro amor de ambos… Os longos beijos no portão, luzes piscando para que ela entrasse… Os beijos no sofá, música no quarto dela, o primeiro amor de ambos… Ester. Como andaria a Ester?

Uma coisa que talvez nunca mais se lembrasse se não pusesse os pés ali: aprendera a dirigir com o pai dela. O fusca do doutor Geraldo. Um fusca sete três, ocre marajó. Quase um pai o Geraldo! Aprenderam a dirigir juntos. Nos finais de semana desciam, ainda sem carta, dirigindo ao pesqueiro da família. Um ia e o outro voltava guiando. Pescavam, cozinhavam, nadavam, bebiam, riam, se amavam… Corriam muito e faziam tudo de novo.

Anuncie aqui

Depois de tirar carta podiam passear com Galaxy do Dr. Geraldo. Um dinheirinho daqui, outro dali, compraram um Jipe. Chegaram até a participar de alguns ralis juntos. Se havia uma coisa que os havia marcado eram os carros, a velocidade que andavam, a velocidade com que se amavam.
Visto assim, parece que nada poderia apartá– los, mas, aos poucos, tudo foi se esvanecendo: a paixão, a casa, os filhos, que nunca vieram, as lembranças…

Ele olha para a esquina, para a casa que era dela e vê sair de lá um garoto, mais ou menos da idade que ele tinha à época, lembra de si mesmo saindo de lá. O menino, que parece não ter carta ainda, entra em um Jipe e sai correndo, como eles faziam. No bar da esquina pede um café e pergunta:

– Quem mora naquela casa?

– A Dotora Ester. – Diz, terminando Ester com aquele R do interior de São Paulo.

– Ela ainda mora nesta casa?!

– Mora sim senhô.

– E o Geraldo?

– Dotô Geraldo… Home bão. Morreu faiz uns cinco ano.

– E a Dona Sônia?

– Dona Sônia tá véia, mais tá forte. Ainda morai com a filha!

– E aquele menino que saiu no Jipe? Quem é?

– O Cersinho? É fio da Esterzinha e do seo Cerso. O senhô conhece eles?

– O Celso… É o Celso Teixeira?

– Isso! – Confirmou o homem.

– Fizemos cursinho juntos. Mas fui namorado da Ester há mais de trinta anos. Ela era linda. Como está ela agora?

– Continua bonita. Parece que o tempo num passa pra ela. Tamém, a muié num para. Vive pra cima e pra baixo, trabaia, cuida da casa, atende um monte de gente. Boa que nem o pai. Atende de graça quem não pode pagá, aqui e nas fazenda da região, vive correndo co carro, pra cima e pra baxo… Dizem que ela corre co esse carro deisde menininha.

– Tinha vontade de ir lá. Dar um abraço na Dona Sônia, ver a Ester, conhecer os filhos…

– Vai! Acho que vão ficá contente.

– Sei não… O marido… Aparece lá o primeiro namorado, bem de vida, em boa forma, feliz… Os abraços, antigas histórias… Como é o marido dela?

– Óia o seo Cerso lá… No banco da praça.

Ele olha e vê o grupo, no banco favorito, papeando na praça, sem poder mais reconhecer qual seria o “Cerso”.

– O que ele faz?

– Dá aula na faculdade de engenharia… Aqui na cidade do lado.

– Professor de Engenharia?

– Mais é meio esquisito. O senhô acredita que ele vai de ônibus todas as noite com os estudante. Ele não dirige. Gozado, né?. O senhô sabe que dizem que a dotorinha até participô de corrida de carro quando era moça?

– Sei sim! Bem, eu vou indo. Obrigado.

– E o senhô não vai lá fazê uma visita pra família.

– Não. Não vou não.

– Por quê?

– O “Cerso”… Ele nem dirige.

Anuncie aqui

Antônio Fais

Colaborador

Escritor, Filósofo, Professor, Especialista em Linguagem e Aprendizagem.

Anuncie aqui

Mais artigos do autor

Anuncie aqui
Anuncie aqui

Curta nossa página no Facebook

Anuncie aqui
Anuncie aqui

Outros artigos

Bastidores da Política

CONFLITO DE INTERESSES NO DAAE Nomeada Procuradora Jurídica do Departamento Autônomo de Água e Esgoto de Rio Claro (DAAE) no início deste mês, a advogada...

Bastidores da Política

Escritórios de advocacia não entram na lista de restrições. Embora seja uma das profissões mais nobres, muita gente não entendeu a inclusão dos escritórios de...

Tema indigesto

Anuncie aqui

Mais notícias

Rebecca Rabeca lança single “Voz que Guia” e anuncia álbum de estreia

Violinista de Rio Claro adotou a rabeca como instrumento principal e traz a regionalidade e natureza para os palcos. A musicista rio-clarense Rebecca Rabeca lança,...

Rock in Rio começa nesta sexta-feira

Encontro vai até domingo dia 22 na Cidade do Rock, na Barra da Tijuca. O festival de música Rock in Rio começa nesta sexta-feira (13)...