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Quatro, cinco, seis

– Alô!
– Laura? Gilberto. Tudo bem?
– Que horas são?
– Duas.
– Da madrugada?! Aconteceu alguma coisa? Tá tudo bem?
– Eu queria lhe pedir perdão.
– Perdão?! Por quê? Ah! Tá perdoado.
– Estou falando sério.
– Eu também. A esta hora perdoo qualquer coisa.
– Eu não queria lhe ter dito o que disse.
– Esquece. Já faz tanto tempo. E agora é tarde.
– Pra você me perdoar?
– Não! Eu já disse que perdoo. É tarde da madrugada! Eu estava dormindo.
– Então você me perdoa?
– Perdoo!
– Que bom! Eu não ia conseguir dormir se não falasse com você e você me perdoasse.
– Acho que nem eu.
– Como assim?
– Deixa pra lá. Vamos dormir?
– Agora acho que vou conseguir dormir.
– Espero que eu também. Boa noite!
– Boa noite.

*****
– Alô.
– Laura? Imagino que você não tenha conseguido dormir depois de nossa conversa.
– Oi. Que horas são?
– Sete.
– Tudo bem? Você me ligou ontem à noite, né?
– Você não se lembra?
– Vagamente. Eu estava dormindo. Depois dormi direto e ainda estou meio sonada.
– Puxa!
– Você queria me pedir perdão… Eu nem sei porquê.
– Pelo que lhe disse quando a gente terminou.
– Já faz tempo. Tá tudo bem.
– Tá tudo bem mesmo?
– O que houve? Por quê esse arrependimento repentino?
– Tudo que eu lhe falei…
– É. Na época fiquei muito magoada mesmo. Também você chegou para mim e disse que me olhava e não sentia mais nada. Ou seja que eu não era nada. Lembra?
– Sim.
– Até lhe perguntei se tinha outra e você falou que não. Fiquei perdida.
– É. Mas tinha.
– E por que você não falou?
– Sei lá. Não tive coragem. Achei que você ficaria muito magoada.
– É pior o que você me falou: que eu não era nada. Ser trocada por outra, tudo bem. Mas por nada!
– Sei…
– E o pior: Eu suportava várias coisas suas. Não leve a mal, mas você é meio complicado. No começo me ligava a toda hora, para saber onde estava, o que fazia. Morria de ciúmes à toa. De repente, para e não liga mais. Você nunca foi carinhoso, atencioso…
– Puxa, Laura!
– Sim. Você me tratava mal e eu, infelizmente, aceitava. E, é meio chato falar, mas mesmo o sexo era ruim. E, ainda assim, eu não servia para você! Foi difícil.
– Pô! Eu ligo para pedir perdão e fica querendo me arrasar.
– Não. Eu tô só contando como me senti.
– Mas precisa falar que eu era ruim de cama.
– Você que está dizendo isso.
– Por que você nunca me disse isso? O que tinha de errado?
– Você dava uma rapidinha e pronto. Quando eu tava começando esquentar…
– Você está namorando?
– Não exatamente. Tenho um grande amigo, mas a gente resolveu não namorar.
– Ficando! Moderna você!
– Pode-se dizer que somos “ficantes”. A gente sai quando dá, quando a gente tá a fim. Não tem ciúmes. Cada um mora em sua casa, mas vez por outra passamos o final de semana juntos.
– Como a gente fazia?
– Não. Ele cozinha para mim. Eu lavo os pratos. A gente vai comer fora de vez em quando.
– E ele é bom de cama?
– Desencana!
– É ou não é?
– É diferente. A gente, quando fica junto, dá um tempo para saber o que o outro quer. Não tem essa de ficar contando problemas ou coisas boas que fizemos. A gente fica em paz e descobre o que ambos querem fazer. E o que fizer a partir daí é bem feito, pois era o que ambos queriam.
– Eu que achava que você queria casar?
– Acho que até queria, não quero mais. Dura bem no máximo dois anos, depois se aturam.
– E eu achei que você estava magoada comigo!
– Que nada! A melhor coisa que me aconteceu foi aquele pé na bunda! Vi que esperava coisas erradas dos homens. Que eles podem dar muito mais. Se não fosse com você, teria me casado de novo com outro qualquer. Agora não, vivo bem assim e se ficar sozinha, fico bem também.
– Então tá. Eu só queria mesmo pedir perdão.
– Tá perdoado. Tá bom assim. Um beijo.

*****
– Alô.
– Laura, quantas ele dá?
– Gilberto, deixa isso pra lá.
– Quantas?
– Sei lá. Quatro, cinco, às vezes, seis.
– Tá me gozando? Ninguém consegue isso!
– É que ele não gasta energia jogando futebol a tarde toda e depois tomando cerveja com os amigos. A gente, quando sai, não vai a rodízio, vai a restaurante japonês, toma vinho ao invés de cerveja…
– Ah. Então é rico.
– A gente racha a conta, cacete!. Esqueceu que eu ganho bem. Você que falava: “mulher minha não paga a conta”.
– Mas seis! Quantos anos ele tem?
– Para com isso.
– É garotão, né? Quantos anos?
– Quarenta e seis.
– Quarenta e seis!
– Olha, meu celular está tocando. Outra hora a gente se fala. Beijo.

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*****
– Alô!
– Oi Laura.
– Pô, Gilberto. Que horas são?
– Meia-noite. É que eu não conseguia dormir.
– Que foi agora?
– Quatro, cinco, seis?!
– Desencana. Boa noite!

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Antônio Fais

Colaborador

Escritor, Filósofo, Professor, Especialista em Linguagem e Aprendizagem.

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