Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo diz que salário de R$ 5 mil provoca fuga de cérebros do Estado
Apesar do grave déficit no quadro de pesquisadores científicos do Estado de São Paulo, o concurso do governo estadual para apenas 11 vagas anunciou, número que representa menos de 3% do total necessário para reportar a força de trabalho nos institutos públicos de pesquisa ligados à Secretaria de Estado da Saúde (SES). Segundo dados apurados pela Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC), atualmente, 368 cargas estão previstas de um total de 855 previstas em lei, o que significa que 487 posições estão vagos, comprometendo diretamente a capacidade de resposta do Estado a temas estratégicos ligados à saúde pública.
“A pesquisa pública de base foi o que garantiu ao Brasil, durante a pandemia de covid-19, chegar a uma vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan, uma das instituições que compõem a estrutura científica ligada à Secretaria de Estado de Saúde. Sem investimentos, estamos negligenciando o tempo de resposta para crises que seguem desafiando a sociedade, como dengue, zika, chikungunya, malária, febre amarela, chagas, dentre outras”, afirma Helena Dutra Lutgens, presidente da APqC.
As vagas previstas no concurso serão específicas apenas para o Instituto Butantan. Nenhuma contratação foi prevista para as demais instituições da Saúde, como o Instituto Adolfo Lutz, Instituto Dante Pazzaneze de Cardiologia, Instituto Lauro de Souza Lima, Instituto Pasteur, Instituto da Saúde, Laboratório de Investigação Médica-LIM (HC-USP) e Sucen, extinto em 2020 e que tem sua estrutura e pesquisadores ligados ao Pasteur.
Salário
Além da escassez de vagas, a defasagem salarial torna o cenário para a substituição de pesquisadores nos Institutos Públicos ainda mais crítico. A remuneração inicial oferecida no concurso para pesquisador científico do Butantan é de R$ 5.037,04, menos a metade do que é oferecido pela Embrapa, que em seu concurso de 2024 distribuiu vencimentos iniciais de R$ 12.814,61.
“A comparação evidencia o descompasso entre São Paulo e o restante do país quando o assunto é valorizar a ciência. É um processo de desmonte que se arrasta ao longo dos últimos anos e que se acentuou no atual no governo, fazendo com que haja uma fuga de cérebros do Estado mais importante do país”, destaca Lutgens.
Os pesquisadores também enfrentaram perda salarial ao longo dos últimos anos. Segundo estudo feito pela APqC, enquanto a inflação atingiu 92,68% entre novembro de 2013 e março de 2025, o salário dos pesquisadores foi reajustado em apenas 20,68%.
Outras secretárias
Além da falta de pesquisadores na área da saúde, as Secretarias de Agricultura e Abastecimento (SAA) e de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil) também enfrentam um apagão de ciência. Na SAA, 448 cargas de pesquisador estão fornecidas, enquanto 746 permanecem vagas. Já na Semil, o número é ainda mais reduzido: apenas 130 pesquisadores em atividade, frente a 152 vagas em aberto.
“Estamos diante de um processo de desmonte silencioso. A ciência paulista resiste, mas sem pesquisadores, laboratórios e condições adequadas, não há como atender às necessidades da população com qualidade e inovação, especialmente diante do cenário de crise climática”, alerta Lutgens.
O problema se estende ainda às carreiras de apoio, fundamentais para o funcionamento diário dos institutos e manutenção das áreas de pesquisa. Na Secretaria da Agricultura, apenas 621 cargas de apoio estão fornecidas, enquanto 3.793 permanecem vagos. Na Saúde, são 282 provisões e 1.831 vagos; e na SEMIL, 212 profissionais atuam em meio a um déficit de 1.092 cargas não ocupadas.
Atualmente, São Paulo conta com 16 Institutos Públicos de pesquisa. Somando cargos de pesquisador e carreiras de apoio, são mais de oito mil postos de trabalho no Estado.
“É impossível planejar o futuro da pesquisa pública com esse nível de reposição. Estamos perdendo cérebros, know-how e capacidade instalada que levaram décadas para ser construído”, afirma.