Por: Priscila Assumpção
A claridade aumentava aos poucos na janela à medida que o sol nascia. O canto dos pássaros cumprimentava o novo dia com alegria. Ana se encontrava naquele estado entre sonhar e acordar. Começava a tomar consciência da própria respiração, dos sons à sua volta, mas ainda queria continuar no sonho.
Tentou resgatar a história, a cena que estava vendo antes de acordar, mantendo os olhos fechados contra a claridade que aumentava. Em seus sonhos, Ana vivia lindas aventuras, era paparicada por todos, viajava para lugares maravilhosos.
De repente, um barulho fez com que os olhos de Ana abrissem e ela sabia que um dos cachorros tinha tentado abrir a lata do lixo novamente. Deu uma espreguiçada e levantou-se para ver o tamanho do estrago. Achou o chinelo porque não queria repetir a experiência de pisar em sujeira com o pé descalço.
O cheiro de urina permeava toda a casa. Por mais que limpasse, não conseguia vencer o tanto de bexigas caninas que insistiam em se esvaziar onde bem entendessem. Mas não tinha coragem de falar para a mãe se livrar dos cães. Eram a distração dela, já que não parecia restar mais nada para lhe dar alegria. E, no fundo, Ana acabava se afeiçoando a cada um deles também.
A mãe ainda estava dormindo, vivendo suas próprias aventuras, supôs Ana. Ela colocou água para ferver para fazer o café e foi pegar o balde. A rotina era tão conhecida que o corpo de Ana ia no automático, então ela aproveitava para pensar no sonho e imaginar como seria realmente viver aquelas aventuras.
“Acho que nem todos nasceram para serem ricos”, pensou, suspirando. Ao levantar o balde, Ana deu de cara com um passarinho ferido. Ele olhava assustado para Ana. Com muito cuidado, ela o pegou nas mãos e falou baixo, quase sussurrando:
– Vou cuidar de você. Logo vai estar voando com seus amiguinhos.
Ana cuidou dele até perceber que ele estava pronto para voltar à natureza. Abriu a janela e o soltou. Ele deu o que parecia ser uma volta de despedida e sumiu. Ana sentiu uma paz, a sensação de um trabalho bem feito. Com um leve sorriso no rosto, voltou a seus afazeres.
Colaboração: Priscila Assumpção, Terapeuta, Mediadora, Especialista em Comunicação.
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