Por: William Nagib Filho
Consoante dados declarados pelo Município de Rio Claro ao Tesouro Nacional, as contas públicas de nossa Cidade Azul figuram dentre os 5 maiores rombos do país, com R$ 232,8 milhões em 2019 (Estadão do dia 10 de outubro).
Esse dado alarmante preocupa o Rio-clarense, que quer ver sua cidade funcionando bem, ao menos nos setores prioritários, o que demanda recursos suficientes para engraxar as engrenagens da máquina pública. Como será 2021 para o novo prefeito?
Duas questões jurídicas chamam a atenção: a segunda parece neutralizar, de alguma forma, a primeira!
A primeira é como ficarão as contas de Rio Claro neste último ano de mandato, uma vez que, segundo previsto no artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF -, é proibido ao titular do Executivo, nos últimos dois quadrimestres do mandato, contrair obrigações de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte. Isso evita que o novo eleito assuma a gestão já arcando com dívidas acumuladas pelo antecessor.
Numa primeira análise, se Rio Claro já está com seus cofres bem ruins em 2019 segundo o ranking publicado no “Estadão”, imagine-se agora, em 2020, diante da crise sem precedentes e inevitável queda de receita. Ao menos em tese, tudo direcionaria para possível violação da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Contudo, houve uma alteração na LRF, justamente por conta da pandemia, modificação essa trazida pela Lei Complementar 173, que criou o socorro federal a estados e municípios, afastando essa obrigatoriedade de se garantir disponibilidade de caixa para quem irá assumir em 2021, desde que os recursos sejam destinados ao combate à calamidade pública reconhecida.
O fato é que prefeitos em fim de mandato (muitos em campanha para reeleição, gastando os tubos para mostrar serviço) estão lutando para que haja flexibilização para toda e qualquer espécie de despesas, e não só as destinadas ao combate da pandemia.
Os Tribunais de Contas (e o Ministério Público de Contas depois) terão muito trabalho pela frente, estimam os especialistas, diante das brechas que a Lei traz em seu conteúdo e o próprio contexto da situação dos cofres públicos.
Portanto, a regra geral é: ordenar despesa em fim de mandato sem que haja dinheiro em caixa (deixar como herança dívidas ao seu sucessor) é prática vedada pela LRF, ato considerado, inclusive, crime pela Lei Federal 10.2028/2000 (Lei de Crimes de Responsabilidade Fiscal) com pena de reclusão de 1 a 4 anos.
De outro lado, a regra especial em tempos de pandemia é a seguinte: fica afastada a obrigatoriedade de disponibilidade de caixa, pelo governante que sai, em favor daquele que assume em 2021.
Daí veremos se as despesas incluídas nesse verdadeiro “salvo conduto” ficarão adstritas às relacionadas à calamidade ou se os intérpretes dos Tribunais de Contas aceitarão também outras espécies de gastos, num grande “pacotão” que poderá livrar de um processo crime aquele prefeito que não foi primoroso no administrar as contas municipais.
William Nagib Filho – Advogado, é Conselheiro da OAB/SP