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Militarização da escola pública: educação x disciplina militar

Na contemporaneidade uma novidade adentrou os muros da escola. Trata-se da intervenção militar nas escolas públicas ocorrida em Goiás e Amazonas. Na militarização, como está sendo chamada a parceria entre Secretarias da Educação e Secretarias de Segurança, a administração das escolas é coordenada pela Polícia Militar que implanta princípios básicos militares como “hierarquia e disciplina”; que visa diminuir a violência contra os alunos e rofessores.

Não é a primeira vez na História da Educação de nosso país que a intervenção militar ocorre na escola pública com objetivos análogos. É possível conferir na coleção de Leis Imperiais e seus anais que no início do século XIX, D. Pedro I promulga a Lei para a instrução tendo a educação entre as ações realizadas pelo Império para “conter” a violência provocada pela população de homens livres, a margem da sociedade, sobreviventes da escravidão, que apresentavam ameaças e necessitavam de controle.

Apoiando-se ao método lancasteriano, que entre seus princípios prezava pela disciplina, ordem, e como ferramenta de repressão fazia uso da violência para controlar os corpos tendo os soldados como os primeiros professores. No século XXI eles, os soldados, amparados por essas parcerias, entram nas escolas, agora não mais como professores, mas enquanto gestores e responsáveis pela disciplina dos alunos. E sob a responsabilidade dos militares os estudantes são obrigados a cumprir as regras da cartilha militar, que assume o caráter de banir da escola comportamentos inadequados.

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Essas regras apresentam-se autoritárias na medida em que proíbem meninos e meninas de escolherem o próprio visual como o tom do esmalte de cor chamativa, o uso de batom, as gírias que são a identidade de uma faixa etária que abrange os alunos dessas escolas; o corte de cabelo ou da roupa a ser vestida, pois nessa doutrina há a obrigatoriedade do uso da farda. Além disso, o tão afetivo bom dia é trocado pela saudação e contingência militar.

Essas ações indicam que além da violência, as microviolências, dificuldades nas relações interpessoais (indisciplinas, incivilidades e transgressões) estão também entre os objetivos dessa intervenção nas escolas. Ao implantar esse modelo disciplinar não se permite que a diversidade, a pluralidade de ideias e as resoluções de conflitos que fazem parte do desenvolvimento humano possam contribuir com a finalidade da escola, que consiste na construção da autonomia intelectual, da cidadania.

Pois, na disciplina militar o problema da violência e das microviolências são resolvidos de modo paliativo, já que força o cumprimento de regras e normas autoritárias, com a presença da autoridade policial. O que não permite avançar à superação do comportamento heterônomo, que precisa de interações, participação ativa do ambiente escolar, da construção das regras de conduta e de trabalho, das resoluções de conflitos de forma positiva, de espaços para o diálogo, para que esses jovens possam vivenciar um comportamento ético, a cidadania, experimentando os princípios constitucionais de uma escola democrática, pautada no pluralismo de ideias e concepções pedagógicas.

A mídia mostra que o resultado da intervenção militar no meio escolar tem sido satisfatório, houve diminuição da violência pautada na imposição das regras militares, mas também, na imensa transformação nessas escolas em seu aspecto físico, deixando-as limpas, organizadas, climatizadas, belas (por que não houve o investimento na transformação dos aspectos físicos antes da intervenção militar?). É compreensível que o resultado seja satisfatório, pois dentro do caos instaurado nessas unidades a intervenção militar resgatou o princípio da autoridade, da importância da rotina, responsabilidade, disciplina.

Ações necessárias para que esses meninos e meninas tenham sucesso na construção do conhecimento, mas ao utilizar a repressão para que as regras e normas sejam cumpridas, não se permite que esses garotos compreendam os princípios éticos que as regem e a importância de participar ativamente do cotidiano escolar e construir a autodisciplina que ocorre nas relações interpessoais.

A autodisciplina e a organização são importantes, porém não na base da repressão. O que colabora com a resolução do problema, mas pelo medo e no reforço de fazer o certo na presença da autoridade, nesse caso os militares, policiais armados dentro das escolas. O que obriga os estudantes à obediência por medo da punição. Mostrando, ainda, que a escola escancara sua incapacidade de resolver os problemas da violência, das microviolências.
A intervenção militar no século XXI apresenta aspectos diferentes da ocorrida no início do século XIX, mas baseada nos mesmos princípios ao utilizar da repressão para conter a violência e as microviolências, controlar os estudantes sem permitir com que esses meninos e meninas vivenciem um ambiente que oportunize situações para pensar e discutir o problema.

E que juntos, no debate, reflitam sobre uma alternativa para sua resolução. Tendo garantido uma escola bem cuidada, com profissionais com conhecimento para atender as dificuldades surgidas. E a escola tomando para si uma responsabilidade que é sua, sem terceirizar suas dificuldades a judicialização da educação.

Rosemeire Archangelo é Doutora em Educação e professora e articulista do Portal “Rio Claro, Cidade Nossa!”.

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